Tenho uma amiga desde a adolescência que
sempre se divertiu com o meu jeito, digamos, um tanto distraído. Recentemente,
enviei uma mensagem a ela para contar um dos meus últimos "foras". E
foi o seguinte:
"Marie,
me esqueci de te contar esta:
Num dia desses, desci do elevador. Logo
olhei para a parede do corredor e pensei: Cadê o meu quadro de flores? O
capacho também não estava na frente da minha porta. Pensei: “Será que o
funcionário da limpeza o pegou para lavar, apesar de nunca fazer isso?” Enfim,
senti falta do meu enfeite de sininhos com golfinhos na porta. Só, então, olhei
para o número do apartamento (já com a chave na mão, prestes a colocá-la na
fechadura).
Eu tinha descido num andar acima do meu!
Acontece que nós, intelectuais (Ah, ah!),
não somos destrambelhados. Apenas costumamos estar com a mente em outro
lugar... No mundo da lua!
Neste
mundo “multitarefas" em que vivemos _ sendo que o certo seria
fazermos uma coisa de cada vez _, acabei me tornando uma pessoa distraída
no dia a dia. Ou talvez seja mesmo algo da minha natureza, não sei. No trabalho
ou em questões mais sérias, compenso isso me empenhando para ter atenção
redobrada no que faço. Agora, no cotidiano, é fato que, me juntando a
todos, não me resta escolha, a não ser rir de mim mesma. Minha distração
me leva a incontáveis micos, desde como vivo tentando entrar no carro errado na
saída de algum lugar (Para mim, todos os carros prateados são praticamente
iguais.) até como saí na rua um dia desses, sem perceber, com um brinco
totalmente diferente do outro em cada orelha ou, ainda, num outro dia,
quando tranquei a chave dentro do armário do vestiário e tive de
chamar uma funcionária do lugar para arrebentar o cadeado com um baita alicate.
Uma vez, quando ainda trabalhava como
secretária numa empresa de engenharia, era véspera de feriadão _ uma
quinta-feira _ e, depois do expediente, eu não teria aula na faculdade naquela
noite. Assim, lá subi eu o quilômetro de sempre até o ponto, peguei minhas três
conduções (ônibus/metrô/ônibus) e cheguei alegre e saltitante em casa,
pronta para curtir a folga prolongada. Foi, então, naquele segundo, quando mal
havia entrado em casa que me ocorreu: "Ai, esqueci o ventilador da firma
ligado!"
Pronto, foi quanto bastou para que meu
feriadão fosse por água abaixo. Fiquei lá, me torturando, refazendo cada passo
mentalmente, tentando lembrar se havia desligado o ventilador, mas nada. Havia
um branco total na memória; em relação a apena isso, claro. Até de todas as
músicas que eu tinha ouvido no meu inseparável walkman vermelho eu lembrava!
"Vou ter que voltar lá!", pensei desanimada, imaginando a longa
jornada de volta de cerca de uma hora e meia, ou a firma pegando fogo devido a
algum curto causado pelo ventilador ligado.
Só então tive a ideia óbvia. Liguei
para um colega que morava mais perto da empresa, talvez a uns vinte
minutos de lá. Ele se prontificou a ir checar para mim e teve de correr o risco
de ser preso entrando pela janela, pois não havia mais vivalma na firma. E voilà! Quando ele entrou para verificar,
o ventilador estava... desligado, no final das contas.
Desde aquele dia, costumo checar se o gás está desligado umas duas vezes
antes de ir dormir. Está longe de ser TOC. Simplesmente não tenho tempo para
ter TOC, embora me compadeça muito de quem sofre desse mal. É algo terrível, pelo
que se observa, mas tem tratamento, claro.
Outra coisa que minha amiga adora relembrar é
uma vez em que, seguindo ao encontro dela no ponto de ônibus para a ida à
faculdade, contornei um carro atravessado na calçada sem notar que ele tinha
batido na banca de jornal próxima e a arrastado junto (sem ninguém dentro,
soube depois). É a velha distração.
Já saí para a rua com uma toalha molhada
de banho dependurada no braço... Só até a calçada. Pego o carrinho de compras
dos outros em vez do meu no corredor do supermercado; troco nomes vez ou outra;
pego ônibus errado ou desço fora do ponto; não noto absolutamente nenhuma
diferença na mudança de decoração dos outros... essas coisas. Já me
disseram que eu deveria caminhar com um GPS pela rua...
Tenho outra amiga no meu grupo de e-mails
para quem vivia repassando mensagens havia um bom tempo. Aqueles e-mails de
antes da febre do facebook, com mensagens do tipo "Dicas para o seu
bem-estar"; "Veja que imagens lindas!"; "Jesus te ama",
“Repasse para 20 amigos, se não...” e por aí vai. Só que havia umas mensagens
meigas que nós, garotas, costumávamos passar só para as mulheres do grupo, como
"Amigas para sempre", "Adoro você, amiga", "Repasse
este e-mail só para as amigas do peito" e, claro, aqueles e-mails com
"saradões" que diziam "Vejam que pedaço de mau caminho",
"Oh, homem danado de lindo", "Mama mia, esses são de tirar o
fôlego". Vestidos, claro! Bom, sem camisa... né? Enfim, vocês sabem,
meninas, aqueles e-mails inocentes, mas de encher os olhos, cheios de
"pedaçudos*", só para admirar. Aconteceu, então, que, de repente, tive
de mandar um e-mail confidencial, com um assunto muito sério, que era para ser
conversado apenas entre nós duas e, claro, pedi absoluto sigilo a ela. Minha amiga
me mandou um e-mail em resposta logo depois me dizendo que aquele endereço de
e-mail que eu estava usando havia tempo era do marido dela!
Ah, lembro também de uma vez em que fiz um
importante ultrassom no laboratório errado, exatamente no mesmo prédio do
laboratório em que o meu exame estava marcado. Lembro de outra vez, quando
secretária, que simplesmente recebi um cliente da empresa, todo formal, que
havia chegado para uma reunião com o diretor, com nada menos que dois beijinhos
no rosto, sendo que deveria ter apenas trocado um aperto de mão com
ele e olhe lá! Gelei na hora, percebendo o que havia feito, com a cabeça de
vento sabe-se lá onde, mas tive que fingir indiferença, né?
Num dia desses, numa fila para tirar fotos
com famosos, falei a um jornalista ilustre que não queria
tirar uma foto com ele, porque deu um "branco" qualquer na hora. Daí,
o chamei, mas ele foi embora aborrecido... Certa vez, eu estava caminhando
pela rua quando vi, pelo canto do olho, algumas moças sentadas na calçada. Uma
delas falou algo comigo. Então, respondi gentilmente:
_
Desculpe, bem, mas estou sem trocado hoje.
Ela
me disse:
_
Não, não, eu só perguntei que horas são!
Houve aquelas vezes em que falei (não
tão mal assim) de alguém e a pessoa estava bem atrás de mim, em que
já troquei o açúcar pelo sal, já tentei remover esmalte de unha com o frasco de
água oxigenada, comecei a escovar os dentes com pomada... Essas são clássicas,
claro.
Tudo isso é verdade, mas, exageros e
brincadeiras à parte, há uns dois ou três anos, entrei num curso de Tai Chi
Chuan. Entre todas as outras coisas excelentes, o Tai Chi tem me ensinado a
correr menos, a ser mais calma e paciente, a parar para observar o mundo, e eu
tenho aprendido a observar... a observar tudo que realmente importa. Mas isso
já é uma outra história...
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